Filip Calixto   |   21/11/2022 14:56
Atualizada em 21/11/2022 17:55

O potencial ainda invisível do afroturismo no Brasil

Hubber Clemente fala sobre a invisibilidade do Turismo negro no Brasil


Divulgação
Hubber Clemente é fundador da startup ESG Afroturismo HUB
Hubber Clemente é fundador da startup ESG Afroturismo HUB
Profissional do Turismo e da hotelaria há mais de 23 anos, além de fundador da startup ESG Afroturismo HUB, Hubber Clemente é mais um dos nomes que colaborou com a PANROTAS mostrando sua visão sobre o afroturismo no cenário atual do mercado brasileiro. Em seu artigo exclusivo, o Clemente fala sobre um potencial ainda invisível e que precisa ser melhor explorado.

"Estamos no mês da consciência negra, com poucas exceções, não vejo ações de conscientização racial nas empresas do setor. É uma triste e frustrante realidade para mim, profissional negro com mais de 20 anos de experiência no setor", escreveu Clemente, que em seu currículo tem passagens por redes como Accor, Blue Tree e BHG, além de OTAs e startups.

O artigo completo está disponível logo abaixo:
"Afroturismo: Potência ainda invisível no Turismo brasileiro
Viajar é um dos principais desejos do ser humano. Quando o Turismo se transforma em uma atividade social também voltada ao lazer, virou uma das metas de vida da maioria das pessoas poder viajar para lugares turísticos, ter ótimas experiências sociais, através do conhecimento de novas culturas que o turismo consegue proporcionar. A pandemia fez o turismo mundial paralisar por um tempo, o que levou as pessoas a valorizar ainda mais a atividade pós pandemia. E esta valorização gerou a mudança no comportamento do consumo do turismo, focado muito mais na experiência dos clientes. Mas infelizmente para turistas negros, estas experiências nem sempre são felizes devido ao racismo estrutural, ainda forte e resistente no Brasil.

Falar de racismo é incômodo, desgastante, triste..., mas infelizmente é preciso conversar muito sobre o tema para buscarmos uma solução para este mal extremamente prejudicial para nossa sociedade. Quanto mais" fugimos" ou ignoramos falar sobre, mais se acumula uma série de problemas que podem explodir à medida que a sociedade se mobiliza para eliminar o mesmo. O problema é mundial, mas principalmente no Brasil o combate ao preconceito contra pessoas negras é árduo, pois devido à história da formação da nossa sociedade, temos várias complexidades que muitas vezes paralisam as reflexões, debates e ações.

Todo preconceito é um" vírus social" que precisa de um ambiente favorável para se espalhar, contaminar e resistir, sendo utópico achar que não precisa de uma " vacina" para resolver o problema. E esta vacina são as ações efetivas e focadas para combater este mal. Estas ações se tornam efetivas quando estão prioritariamente conduzidas por quem tem o lugar de fala, por quem sofre com preconceito diariamente. Atualmente, que cada vez mais pessoas se declaram explicitamente racistas, não é possível romantizar quando falamos do assunto. É preciso encarar a realidade e buscarmos juntos as soluções, que não serão perfeitas inicialmente, mas que podem ser aprimoradas ao longo do caminho.

Geralmente quando falamos de um problema no nosso setor, principalmente incômodos como este, nos perguntamos qual seria a solução. No turismo brasileiro vejo que o afroturismo é o caminho ideal para combatermos o racismo no turismo nacional. O movimento comtempla a inclusão racial no turismo focado no turismo afrocentrado, com o turista e profissional negro como protagonista das reflexões e ações. Temos lideranças negras que pensam o movimento estrategicamente e estão preparadas para tornar o setor mais diverso e inclusivo para pessoas negras. Estas lideranças estão agindo para construir meios para turistas negros praticarem turismo sem racismo.

Nosso movimento tem buscado conversar com as principais empresas, associações e entidades de classe do setor para conscientizar da urgência de tratarmos os efeitos prejudiciais do racismo no turismo nacional, mas recebemos pouca atenção, percebemos muita omissão e até uma certa resistência das mesmas. Não é justificável, mas é explicável, pois quando falamos que o racismo é estrutural, sabemos que setores tradicionais e conservadores tendem a resistir em falar de temas que são desconfortáveis.

O problema é que outros setores econômicos, que estão conectados com turismo estão avançando com ações efetivas combate ao racismo, tornando a vida dos preconceituosos cada vez mais difíceis e os mesmos vão recorrer a ambientes onde não serão punidos, pois não veem posicionamentos públicos de combate ao preconceito. Lembrando que placas dizendo que "não compactuam com preconceito", "somos todos iguais", "somos diversos", estão ultrapassadas, pois não inibem preconceituosos, com a certeza da impunidade se cometerem qualquer ato racista ou preconceituoso.

Se a empresa não recebe o letramento racial e treinamento para lidar com caso racismo, a tendência é sempre favorecer a quem a estrutura social normalmente protege. O não é culpado pelo racismo existir, mas o problema existe e fingir que não existe é tornar-se cúmplice. E tornar invisível todo potencial que existe em investir no afroturismo. Negros são 56% da população brasileira com um potencial de consumo de R$ 2 trilhões, dados que são ignorados quando esta população não se vê representada em ações inclusivas. Estamos no mês da consciência negra, com poucas exceções, não vejo ações de conscientização racial nas empresas do setor. É uma triste e frustrante realidade para mim, profissional negro com mais de 20 anos de experiência no setor.

É possível mudar este status simplesmente apoiando o afroturismo, investindo financeiramente em ações inclusivas, por palestras, treinamentos e consultorias, contratando profissionais do movimento com estas expertises. E digo sim para contratar, pois temos que parar de tratar o tema como solidariedade ou semelhante... combater efetivamente preconceito, ser diverso e inclusivo deveria ser valor para empresas que acreditam num capitalismo consciente, em ESG. E pode ter certeza que quem investe em inclusão e diversidade tem comprovadamente retorno financeiro, mas quem é omisso em relação ao racismo leva como bônus o prejuízo de invisibilizar todo potencial de consumo dos turistas negros."

Em virtude do mês da Consciência Negra e do dia nacional, celebrado ontem (20), a PANROTAS publicou uma sequência de artigos refletindo sobre o papel dos profissionais negros no contexto atual do setor. Publicaram também artigos a respeito do tema:

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