Danilo Teixeira Alves   |   04/09/2019 09:45

Especial Aviação (Parte 3): bagagem grátis é boa para quem?

As receitas extras estão se tornando cada vez mais relevantes dentro do balanço financeiro das grandes empresas aéreas. Como as aéreas lidam com elas?

As receitas extras estão se tornando cada vez mais relevantes dentro do balanço financeiro das grandes empresas aéreas nacionais. Tudo o que é cobrado além do bilhete aéreo é considerado pela companhia uma receita auxiliar (que gira de 10% a 15%, em média, do movimento das companhias). Entende-se por aí: marcação de assento, excesso de bagagem, acesso à internet ou à sala vip, entre outros serviços. Muitas delas incluem a venda de publicidade a bordo, pintura da fuselagem de aviões e até a comercialização do serviço de bordo.

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Decisão de franquia de bagagem gratuita está com o presidente Jair Bolsonaro
Decisão de franquia de bagagem gratuita está com o presidente Jair Bolsonaro

Segundo estudo realizado pela Phocuswright, no ano passado, os serviços auxiliares representaram média de 12% das receitas das empresas aéreas norte-americanas e espera-se que essa parcela continue aumentando. Com o tempo, é provável que o processo de uma companhia aérea para determinar o preço e o posicionamento de auxiliares ideais dentro do fluxo de compras e compras on-line se tornará tão complexo e sofisticado quanto o utilizado para o gerenciamento básico de rendimento de tarifas.

No entanto, a prática ainda não é bem aceita pelos passageiros, principalmente no Brasil. Eles alegam que os preços praticados pelas companhias aéreas nacionais não condizem com a não gratuidade do serviço.

A discussão da retomada da franquia de bagagem gratuita, que ainda aguarda a decisão final do presidente Jair Bolsonaro, mostra muito bem isso. Na nota “Entidades se mostram a favor do veto da bagagem grátis”, onde publicamos na íntegra uma carta assinada pelos presidentes da Abav Nacional, Braztoa, Clia Brasil, Abracorp, AirTkt, Aviesp e Avirrp, encontramos comentários de leitores contra a cobrança. “Uma vergonha essa cobrança de bagagem” ou “Não é possível que eles estão vendo alguma vantagem em ter tarifa sem bagagem” são dois exemplos de como a iniciativa ainda encontra resistência por parte de algumas pessoas.

Mas, afinal, as receitas auxiliares são vilãs? Vieram para ficar ou para ajudar os clientes a encontrarem tarifas mais acessíveis?

Emerson Souza
O diretor de Alianças da Azul, Marcelo Bento
O diretor de Alianças da Azul, Marcelo Bento
“O Brasil não pode viver no atraso. Pouquíssimos países no mundo regulam bagagem, e nós não podemos estar entre eles. Não faz sentido o governo fazer um esforço tremendo para atrair mais investimentos e low costs e, ao mesmo tempo, criar uma regra que vai contra tudo o que elas querer para operar aqui”, afirma o diretor de Alianças da Azul, Marcelo Bento.

A Gol segue a mesma linha e discurso da concorrente Azul. “A Gol sempre foi a favor da desregulamentação da franquia de bagagem, uma vez que desta forma é possível oferecer opções para que o consumidor possa escolher o que melhor se adequa ao seu perfil de viagem”, afirmou o diretor de Canais e Vendas da Gol, Renzo Mello.

Para o diretor de Vendas, Marketing e E-commerce da Latam Brasil , Igor Miranda, a medida também aumentou a fiscalização nos portões de embarques. “A quantidade de malas dentro do avião agora é muito maior, por isso os procedimentos de embarque também são mais rigorosos”.

Na opinião do presidente da Abear, Eduardo Sanovicz, o tema está incorporado ao cotidiano dos brasileiros, assim como no restante do mundo onde a franquia não é regulamentada. “O que nós estamos vendo é que quase 70% dos passageiros optam por bilhetes sem bagagem incluída. Hoje, temos 11 milhões de bilhetes vendidos a menos de R$ 100, o que dá um tarifas de pouco mais de US$ 20”, explica.

Filip Calixto
Igor Miranda, da Latam Brasil
Igor Miranda, da Latam Brasil
Para Bento, da Azul, a mudança no processo educativo dos passageiros é facilmente perceptível. “As pessoas estão procurando levar menos bagagem ou levar apenas bagagem de mão. Estão evitando aquelas malas enormes que víamos antigamente, principalmente quando elas não são necessárias”, afirma. “É um processo justo e honesto. É o que eu sempre digo: não tem almoço de graça. O cliente que achar que a franquia de 23 quilos é grátis está totalmente equivocado.”

De extras, a Azul cobra a franquia de bagagem e a reserva de alguns assentos dentro de suas aeronaves. “Não cobramos por todos os assentos, apenas aqueles que oferecem maior conforto”, garante Bento, que diz também que não há previsão de lançamento de novos serviços pagos.

DE ACORDO COM CADA PERFIL

“A Gol entende que diferentes públicos têm necessidades distintas, e o foco da empresa está justamente em buscar soluções que atendam a estes perfis, personalizando a experiência até chegar ao nível de atendimento individual”, diz Mello. Atualmente, a companhia disponibiliza quatro diferentes tarifas, sendo que em duas delas o passageiro pode levar - sem custos - bagagem despachada, e outras duas opções, com valores mais acessíveis, para quem leva apenas uma mala de bordo, de forma gratuita, com o volume de até dez quilos. Hoje, segundo dados da própria companhia cerca de 30% dos passageiros optam pela tarifa Light, sem franquia de bagagem inclusa.

Emerson Souza
Renzo Mello, da Gol:
Renzo Mello, da Gol: "30% dos passageiros optam pela tarifa Light, sem franquia de bagagem inclusa"

Entre os serviços oferecidos além do bilhete, a Gol companhia mantém a oferta de produtos como locação de carros, em parceria com a Localiza, seguro saúde, com a Sul América, reserva de hotéis, com a Booking, ou a possibilidade de reservar seu bilhete por 48 horas.

“Também temos outras opções de serviços como cardápio de venda a bordo em rotas domésticas (adicional ao serviço gratuito de snacks e bebida), oferta de assentos Gol+Conforto, pacotes de internet a bordo, ou pet na cabine. Estas facilidades têm gerado uma demanda dos clientes por soluções integradas, combinando assim diferentes serviços em sua viagem”, explica o diretor. Questionado qual é a participação das receitas auxiliares no faturamento total da companhia, o executivo disse que a empresa não divulga esta informação.

CONTRA A COBRANÇA DE BAGAGEM
A Comissão Especial de Defesa do Consumidor da OAB Nacional, presidida pela conselheira Marié Miranda, é uma das signatárias de carta aberta enviada ao presidente da República, Jair Bolsonaro, na qual o Sistema Nacional de Defesa do Consumidor (SNDC) requer a aprovação sem veto à redação final do artigo 2º da Medida Provisória n.º 863/2018. O referido artigo isenta os consumidores do pagamento por franquia de bagagem em voos nacionais.

“O consumidor se encontra em claríssima desvantagem quando precisa pagar para poder despachar malas em voos. A OAB foi a primeira entidade a questionar o conteúdo da Resolução 400 da Anac, que regulamenta a cobrança. Criamos a campanha Bagagem Sem Preço, que foi pioneira nesse sentido e alertou para a necessidade de se debater o tema, e agora se faz necessário que o presidente Bolsonaro sancione esta MP para regulamentar a questão em benefício do consumidor”, aponta Marié.

A Câmara de Consumidor e Ordem Econômica do Ministério Público Federal (MPF) também emitiu, em junho, uma nota técnica considerando a necessidade de manter a gratuidade das bagagens. Na nota, o MPF defende que a resolução da Agência Nacional de Aviação (Anac) nº 400, em vigor desde 2016 e que autorizou a cobrança da franquia para despacho de bagagem, contrariou tanto o Código Brasileiro de Aeronáutica como o Código Civil. Na justificativa, o ministério público alega que o contrato de passagem aérea é único e inclui o transporte do passageiro e de suas malas. "Desse modo, o despacho da bagagem não poderia ser cobrado à parte, como contrato acessório", afirma o órgão.

REAVALIAÇÃO DO SERVIÇO
Anunciado em 2016 e implantado no Brasil no ano seguinte, o Mercado Latam, serviço de compra de alimentos e bebidas a bordo oferecido em voos nacionais, deixou de ser oferecido pela companhia no último dia 24 de agosto. Com isso, a aérea passou a oferecer bebidas não alcoólicas (suco, refrigerante e água) e dois pacotes pequenos de biscoito amanteigado.

Divulgação
Venda de alimentos e bebidas nos voos da Latam Brasil está suspensa por 90 dias
Venda de alimentos e bebidas nos voos da Latam Brasil está suspensa por 90 dias
Segundo a companhia, o produto está em fase de reavaliação e deverá passar por mudanças. A ideia, de acordo com o CEO da Latam Brasil, Jerome Cadier, é que o serviço seja relançado até o final do ano, antes da alta temporada. A Latam Brasil ainda não decidiu se o serviço voltará a ser gratuito ou pago, e até estuda um equilíbrio entre as duas opções.

"Tudo está sendo pensado para melhorar ainda mais a experiência do nosso passageiro”, concluiu Cadier.





Nossa série sobre Aviação continua amanhã e segue até sexta-feira. Não perca.

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