Fim do direito à cidadania por nascimento nos EUA enfrenta barreiras e pode ser revogada
Ordem executiva de Donald Trump desafia diretamente a 14ª Emenda da Constituição dos Estados Unidos
O presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, quer acabar com o direito à cidadania por nascimento, algo que existe há quase 160 anos. E embora tenha gerado apoio entre seus eleitores, a decisão levantou preocupações jurídicas significativas, já que a medida enfrenta barreiras constitucionais e pode ser revogada pela Suprema Corte.
“A ordem executiva de Trump desafia diretamente a 14ª Emenda da Constituição dos Estados Unidos, que desde 1868 garante cidadania automática a qualquer pessoa nascida em solo americano”
Daniel Toledo, advogado que atua na área do Direito Internacional, fundador da Toledo e Associados
Para o advogado, essa emenda tem raízes históricas profundas, inclusive ligadas à abolição da escravidão e à igualdade racial. “Mudar algo tão fundamental exige uma nova emenda constitucional, o que implica a aprovação de dois terços do Congresso e a ratificação por três quartos dos estados. Esse nível de apoio é extremamente improvável”, explica.
O principal argumento da ordem executiva é que filhos de imigrantes indocumentados não estão sob jurisdição total dos Estados Unidos, o que justificaria a exclusão do direito à cidadania. No entanto, Toledo aponta inconsistências nesse raciocínio. “Se o território americano não tem jurisdição suficiente para conceder cidadania a essas crianças, como poderia exercer jurisdição para deportar ou punir seus pais? Essa contradição mina a base jurídica da medida”, avalia.
Segundo o advogado, o conceito de jurisdição territorial se baseia na presença física de uma pessoa no território, o que, por analogia, tornaria essa argumentação insustentável. “A medida cria um dilema. Se os EUA não têm jurisdição para reconhecer direitos, não podem exercer deveres punitivos. Isso coloca em risco outras políticas de imigração, como deportações e prisões realizadas pelo ICE”, alerta Toledo.
O provável destino da medida
Embora a ordem executiva já esteja em vigor, Toledo acredita que sua aplicação será temporária. “A medida será inevitavelmente questionada judicialmente e, com base no histórico da Suprema Corte, a chance de ser derrubada é alta. Para fazer essa mudança de forma constitucional, Trump precisaria seguir os trâmites legislativos adequados, algo que demanda um apoio político que ele não tem no momento”, conclui.
Apesar de discordar da abordagem legal adotada, Toledo reconhece que o debate sobre o uso estratégico da cidadania por nascimento é legítimo. “É preciso haver um controle mais eficaz, mas a solução deve ser construída com base em medidas legais sólidas, e não em decisões executivas que geram mais dúvidas do que resultados práticos”, afirma.