Azul terá mais voos no 2º semestre, com combustível e dólar mais baratos
John Rodgerson, presidente da empresa aérea, falou à PANROTAS sobre dívida, malha e distribuição
O presidente da Azul Linhas Aéreas, John Rodgerson, está otimista com o segundo semestre do ano e por várias razões:
- a companhia redesenhou sua dívida de mais de R$ 20 bilhões, tendo renegociado especialmente com as empresas de leasing, e agora se mostra pronta para crescer de forma sustentável e rápida – a crise gerada na pandemia, portanto, passou;
- a empresa já sente os efeitos da queda do dólar (de R$ 5,53 para R$ 4,77 em seis meses) e do preço do combustível;- a Azul ganhou público com a chegada de forma massiva em Congonhas (SP) – Rodgerson revelou que um terço dos clientes da empresa no aeroporto é estreante na companhia – ou seja, nunca tinha voado de Azul;
- os índices operacionais da companhia, que foi a mais pontual do mundo em 2022, continuam em alta, tendo sido a empresa com menos queixas no consumidor.gov.br e a que mais apresentou soluções (o que mostra, também, engajamento do time de colaboradores);
- a tarifa média continua alta e o mercado (especialmente os distribuidores) está “saudável” e sem grandes crises ou loucuras (case Hurb à parte);
- e a Azul Viagens, operadora da empresa aérea, tem registrado resultados acima do esperado, tanto que o plano de lojas foi acelerado e a empresa mais que dobrará o número este ano, chegando a 103. O foco da operadora continua sendo o B2B, com a expansão regional ajudando a alcançar mais agências de viagens pelo País.
Com esse panorama, ao qual se somam outras variáveis, Rodgerson diz que a Azul terá mais voos no segundo semestre (em relação ao primeiro), especialmente tendo as cidades do Nordeste como maiores beneficiadas. Também os investimentos em Manaus e na região Norte em geral também devem continuar na segunda metade do ano.
“Para baratear as passagens, é preciso aumentar a oferta. Usar os horários noturnos, de meia noite às seis da manhã, e os finais de semana, como estamos fazendo nesse último caso com a ajuda da Azul Viagens. E a queda dos custos ajuda nisso. Com o combustível nas alturas e o dólar acompanhando, não é possível ter mais voos. A conta não fecha”, disse à PANROTAS, em entrevista na sede da companhia aérea, em Alphaville, São Paulo.
O que precisa melhorar
A situação está melhor, graças às ações da própria Azul e ao começo do novo governo, mas está longe do ideal, e ele aponta especificamente dois vilões.
1 - A precificação do combustível de aviação, baseada na menor parte importada pelo País (7%);
2 - os custos da judicialização do transporte aéreo.
Segundo ele, há negociações com o governo sobre a questão do combustível, pois só assim a aviação brasileira poderá ser competitiva e o ambiente conseguirá. Inclusive, atrair players low cost.
Quando à judicialização, ele diz que todo o esforço da empresa, “que é reconhecida pelo serviço, que teve o menor número de reclamações no Consumidor.gov no ano passado, e maior quantidade de problemas resolvidos”, é prejudicado com uma verdadeira indústria de compra de processos. Uma solução é bem mais complexa, pois mexe com o Código de Defesa do Consumidor e o entendimento de certas compensações que já são feitas na aviação seguindo a Resolução 400 da Anac e ainda itens que não são compensados lá fora, como os eventos naturais que fecham aeroportos.
Os aplicativos especializados (em processos judiciais contra aéreas), segundo Rodgerson, entram em contato com o passageiro – e pedem casos de até cinco anos –, compram o processo, pagam um valor ao viajante e depois fazem alegações absurdas que os clientes nem sabem, como indenizações por danos morais ou perda de oportunidades. “É a história de toda mala perdida que tinha o vestido do casamento”, ilustra ele.
Indenizações por questões naturais e as que saem da Justiça comum, indo além da Resolução 400 da Anac (que regula direitos dos passageiros) são jabuticabas (ou seja, itens exclusivamente brasileiros) que atrapalham a aviação nacional e sua competitividade, como a questão da precificação do combustível.
O número de processos com que o setor tem de lidar, para Rodgerson, não tem ligação com o aumento de cobranças das aéreas nos últimos anos, quando se alinharam a práticas globais para criação de taxas de serviço, como despacho de bagagem, marcação de assentos, serviço de bordo...
“Não concordo que tenha a ver. A indústria da aviação no Brasil tem ótimos índices. Fomos a empresa mais pontual do mundo em 2022, e nossa concorrente, a Latam, estava no Top 5.”.
MAIS DÚVIDAS À FRENTE
Há mais variáveis que precisam melhorar no País, para que a aviação nacional não apenas recupere as perdas da pandemia, mas também cresça e volte a ser um modal democrático. O presidente da Azul acredita no programa do governo de oferecer passagens mais baratas para aposentados e estudantes, baseando-se na ociosidade dos assentos em algumas datas, mas a democratização e queda das tarifas passa pelo aumento da oferta, desde que as condições, como as citadas anteriormente, sejam viabilizadas.
Entre as variáveis que precisam de respostas e melhorias estão:
- A volta das viagens corporativas. Hoje na Azul esse segmento está em 85% do nível pré-pandemia (em número de passageiros), e Rodgerson acredita que continuará assim no decorrer do ano. Em receita, porém, o segmento já ultrapassou 2019, por conta da tarifa média maior em 2023.
- A concessão de aeroportos tem assuntos delicados a serem resolvidos, especialmente na questão Galeão/Santos Dumont. O presidente da Azul preferiu não opinar sobre o projeto inicial de concentrar no SDU apenas operações para Brasília e Congonhas (SP), mas disse que tudo precisa ser feito com cuidado. A estratégia de hubs da Azul continua a mesma: Campinas (SP), Confins (MG) e Recife. Com grandes investimentos chegando a Manaus, que, no entanto, não pode ser considerado um hub.
- Mais CPFs voando. Segundo estimativa do mercado, apenas de 12 milhões a 15 milhões de brasileiros viajam de avião por ano. Quase nada frente à população do Brasil. Estimular esse acesso ao modal aéreo deve ser visto como estratégia por todos.
- Mais aeronaves entregues. A Azul deve receber mais um Airbus e seis Embraer este ano, mas precisaria de mais aeronaves. As entregas estão atrasadas em todo o mundo e, segundo John Rodgerson, a solução no momento é crescer com a frota já em operação – ou seja, estimular os voos noturnos e nos finais de semana.
- Coibir ações que prejudicam o setor, como a não entrega de viagens (como no caso da Hurb) e a comercialização de milhas, que vai contra o regulamento dos programas de fidelidade e acabam por encarecer os resgates.
FOCO NA EUROPA
Recentemente, noticiamos que a Azul Linhas Aéreas pediu slots no aeroporto de Heathrow, em Londres, um dos mais disputados do mundo. Rodgerson confirmou o pedido (negado pelo aeroporto), mas disse que se trata de algo rotineiro, em busca de oportunidades, e que não há planos concretos de voos para a Inglaterra.
Há, no entanto, foco total na Europa nos próximos meses. O objetivo, segundo ele, é equilibrar a oferta da empresa para a Europa com a dos Estados Unidos. Uma ferramenta importante nesse processo é o acordo com a Tap Air Portugal, que agora pode ser vendida pela Azul em seu site e tem mais 24 cidades europeias adicionadas na nova fase do acordo.
A Azul tem voos diretos para Lisboa e Paris, com ótimos resultados, segundo John Rodgerson.
E OS ESTADOS UNIDOS?
A empresa inicia novos voos para os Estados Unidos esta semana, com as ligações de Confins (MG) e Recife para Fort Lauderdale e Orlando. Há ainda uma ligação inédita da empresa para Curaçao. A Azul vai continuar apostando na Flórida, destino preferido dos brasileiros nos EUA, e não tem planos imediatos para chegar a Nova York – talvez somente a partir de 2024.
Uma novidade que adiou esse desejo de ir a Nova York com voo direto foi o fim do contrato com a United Airlines, que, ao investir na companhia, colocou algumas restrições de operações nos Estados Unidos. Com o término dessas restrições (a United continua acionista da Azul e parceira em voos codeshare), a Azul ampliou seu acordo com a JetBlue e a própria United para voos a partir da Flórida para LaGuardia, JFK e Newark, os três aeroportos que atendem Nova York. E também para outras cidades americanas, como Washington DC. Dessa forma, a malha da companhia nos Estados Unidos ganha mais opções com voos em parceria com a JetBlue e a United Airlines.
AMÉRICA DO SUL FORA DOS PLANOS
Voar para Buenos Aires e Santiago? Fora dos planos da Azul, segundo John Rodgerson. São rotas onde a empresa não vê oportunidade de ganhar dinheiro. A América do Sul não está na estratégia da companhia, que está satisfeita com a parceria que tem com a Copa Airlines.
HURB E DISTRIBUIÇÃO
Tirando o case Hurb, que está em crise devido ao atraso no pagamento a fornecedores e dificuldades na entrega de viagens vendidas, John Rodgerson acredita que o setor de distribuição se encontra calmo e saudável. “Todos sofreram muito na pandemia. Estão todos cautelosos”, disse.
Sobre o caso da Hurb, ele disse que o conceito é bom (ter viagens flexíveis, o que está alinhado com um novo tipo de comportamento do consumidor de viagens – o que tem e quer flexibilidade), mas que é preciso entregar o prometido. Vender uma passagem aérea para daqui a dois anos é algo arriscado, pois nãos e sabe quanto estará o dólar, o combustível, a própria passagem. Uma companhia aérea oferece venda de bilhetes para um período de um ano. Então como uma agência on-line vende uma passagem para daqui a dois anos?
Outra questão da distribuição, o comércio de milhas, segundo a Azul continua a ser um problema que deturpa os programas de fidelidade e encarece os resgates.
FRASES POR JOHN RODGERSON
SOBRE A DÍVIDA DA EMPRESA E SUA RENEGOCIAÇÂO
“Metade da nossa dívida renegociada estamos dando equity para eles (os credores), a outra metade foi para 2030, com juros baixos. Também a dívida vencendo em 2024 e 2026 já repassamos para 2029 e 2030. Então, somos uma das poucas empresas aéreas do mundo a sair da crise sem dar calote, desconto, entrar em recuperação judicial.”
“Nunca passou por nossa mente apelar para a recuperação judicial. Nossa empresa é sólida. O problema da Azul não foi nosso plano de negócio. Muitos buscam a recuperação judicial pois têm um plano de negócios quebrado e precisam consertar isso. Vejam a Avianca que entrou em RJ e saiu como uma empresa completamente diferente, ultra low cost. Mudaram modelo de negócio. Azul não precisou mudar seu modelo. Nosso problema era a dívida da covid. Prova disso é que nenhuma aeronave saiu de nossa frota ou de nossos pedidos de novos aviões. O mercado acredita na Azul.”
“Agora, com tudo renegociado, posso levantar capital para o crescimento daqui pra frente. Vamos promover 130 co-pilotos para comandantes, um recorde. Fizemos grande investimento na Azul Viagens, vamos de 50 para 103 lojas. Veja também nossa unidade de carga, que triplicou. Então estamos saindo da crise mais eficientes, e com faca no dente”.
SOBRE OS MAIORES GARGALOS PARA A AVIAÇÃO
“(A indústria de) Processos judiciais na aviação são um câncer na nossa indústria”.
“Quando o combustível e o câmbio estão altos, você voa menos. Não voa à noite, por exemplo. Como você ataca o preço da passagem? Voando mais, utilizando mais as aeronaves. Azul Viagens é uma prova disso, nos fazendo voar sábado e domingo.”
SOBRE VOAR MAIS E TRANSPORTAR MAIS PASSAGEIROS
“Vamos voar muito mais na segunda metade do ano, em relação ao primeiro semestre, só utilizando mais nossas aeronaves. Muitos desses novos voos para o Nordeste.”
“Preço do combustível no Brasil ainda é o maior do mundo. 93% do combustível é produzido aqui. Apenas 7% vem do Exterior, a um custo 30% maior. Mas a precificação de todo o combustível é baseada no percentual importado. Isso é um imposto que está prejudicando o brasileiro, especialmente a classe média.”
“Número de CPFs que viajam de avião no Brasil está entre 12 milhões e 15 milhões. É nada. Por que mexicanos e colombianos viajam mais que brasileiros? Porque não têm essa precificação. O preço do combustível tem caído, mas esse “imposto” não pode existir”
“Fácil achar que somos vilões (por causa do preço da passagem). Mas 2022 foi ano que Petrobras mais lucrou, e empresas aéreas perderam bilhões de reais.”
“Turismo deveria ser algo estratégico para o Brasil. Isso começa pelos próprios brasileiros, de conhecer mais o Brasil.”
“O preço da passagem está alto no Brasil, mas veja Europa e Estados Unidos, lá também está. A demanda está alta. Aqui podemos atacar esses tributos que só existem no Brasil”.
SOBRE O CRESCIMENTO E INVESTIMENTOS DA AZUL
“Um terço dos nossos viajantes em Congonhas (SP) está viajando pela primeira vez com a Azul. Era estratégico lançar Paris e Congonhas ao mesmo tempo. Esse novo viajante passar a querer saber mais da Azul.”
“Temos mais crescimento no Norte do País. Veja o investimento que estamos fazendo em Manaus, por exemplo, muito importante e estratégico para nossa estratégia da Azul Conecta, para cargas também. Agora temos Manaus-Fort Lauderdale, Belém-Fort Lauderdale. Conectividade para nós é muito importante.”
JUDICIALIZAÇÃO
“A judicialização (na aviação) sempre existiu no Brasil, mas piorou por conta dos aplicativos (que compram possíveis processos). Isso acaba embutido no custo para todo mundo. É um câncer para nossa indústria. E isso com as empresas mais pontuais do planeta. Mais um imposto sobre os clientes. Resolver isso ajudará mais pessoas a viajar.”
VENDENDO TAP
“Estamos animados que agora vendemos Tap, todas as cidades e codeshare que não tínhamos antes; também aumentamos as cidades nas parcerias com JetBlue e United. Ficar meio independente (ou seja, ter mais parceiros) não é ruim para a Azul. Somos uma empresa diferente.”
DISTRIBUIÇÃO E CASO HURB
“Mercado está saudável neste momento. Todos se comportando. Agentes de viagens, consolidadores...todos querem vender. Não tem joguinhos sendo feitos. Todo mundo chegou tão perto da morte, que agora todos têm religião.”
“Melhor coisa para o agente de viagens é acesso ao assento. Essa questão da Hurb ter ido atrás de um nicho flexível é válido, mas tem de entregar. Não tem como saber o preço do combustível e a oferta de voos daqui a dois anos. Indústria tem de focar no que é bom a longo prazo. Criar produtos flexíveis não é ruim, mas não tem mágica. Tem de entregar.”