Filip Calixto   |   07/02/2024 11:21
Atualizada em 07/02/2024 12:49

A questão do PERSE: Governo x parlamentares e empresariado

Representantes do setor apresentam argumentos que fazem do programa fundamental para a recuperação

BRASÍLIA (DF) - Projeto de caráter emergencial montado para socorrer o setor de Eventos e Turismo durante a pandemia, o PERSE (Programa Emergencial de Retomada do Setor de Eventos) virou o debate da semana - e do começo do ano - no cenário político do Brasil, e também no trade turístico.

A princípio criada para ter validade de cinco anos, a Lei n° 14.592/23 (em sua última versão) passou a correr risco de interrupção imediata quando, no final do ano passado, o Ministério da Fazenda, via MP, pediu a suspensão de seus benefícios fiscais. O setor reagiu à investida do ministro Fernando Haddah, contando com o apoio de parlamentares, inclusive das presidências das casas legislativas, e hoje representantes do trade vão passar por gabinetes de deputados e senadores falando da questão, além de realizarem em conjunto um ato público de mobilização dentro da Câmara dos Deputados.

O argumento principal dos empresários e associações que defendem a continuidade do programa é que a paralisação é, por si só, inconstitucional e brecaria uma recuperação ainda em movimento, desconstruindo planos de investimentos em andamento e cortando um ciclo de geração de empregos.

PANROTAS / Filip Calixto
O deputado federal Felipe Carreras é o idealizador do PERSE e um dos parlamentares mais envolvidos na manutenção do programa
O deputado federal Felipe Carreras é o idealizador do PERSE e um dos parlamentares mais envolvidos na manutenção do programa

Do outro lado, o governo federal, representado pelo Ministério da Fazenda alega que o incentivo fiscal dado a empresas do segmento tem gerado uma série de irregularidades e aumentado acima do esperado o índice de renúncia fiscal, prejudicando a arrecadação. Para o ano de 2023, por exemplo a expectativa de renúncia fiscal era de R$ 4 bilhões e os números finais da receita federal mostraram que a renúncia chegou a R$ 17 bilhões.

Outro ponto apontado pelos representantes do governo é a existência de um grande número de empresas que teoricamente não teriam acesso aos benefícios e mesmo assim estão utilizando. Essa manobra seria possível com o preenchimento de informações falsas nas declarações de CNAE (Classificação Nacional de Atividades Econômicas), com essas empresas alegando serem dos setores de eventos e Turismo, mesmo não fazendo parte da atividade.

Tanto os índices de renúncia fiscal como também os casos de preenchimento errado de CNAE estão sob investigação da Receita Federal e da Controladoria Geral da União.

Washington Costa/ Ministério da Fazenda
O ministro da Fazenda, Fernando Haddad, já deu entrevistas admitindo reconsiderar a MP que suspende os efeitos do PERSE
O ministro da Fazenda, Fernando Haddad, já deu entrevistas admitindo reconsiderar a MP que suspende os efeitos do PERSE

Para hoje está marcada uma reunião de parlamentares que defendem o PERSE com o ministro da Fazenda, Fernando Haddad. Segundo os líderes da frente parlamentar em defesa dos Eventos, o ministro está disposto a recuar e dividir a MP em duas, de forma a tirar os setores da reforma, mantendo assim os benefícios do programa.

Os dados

Entre a argumentação do governo e os motivos do setor produtivo estão alguns dados que mostram como está o cenário da atividade, também considerando o impacto do PERSE.

  • Segundo estudo realizado pela Abrape (Associação Brasileira dos Promotores de Eventos), com dados do IBGE, entre os meses de janeiro e outubro do ano passado, o segmento de eventos - compreende o segmento de cultura e entretenimento - apresentou crescimento de 46,6% na geração de empregos, superando até mesmo o setor de serviços - onde está o próprio setor do Turismo -, com 23,4%.
  • Segundo dados do Caged, as empresas que atuam em segmentos vinculados ao Turismo e eventos geraram mais de 110 mil vagas de emprego em 2023.
  • O PERSE representa entre R$ 5,7 bilhões e R$ 10,7 bilhões por ano, ou seja, algo entre 1,45% e 2,74% do Valor Adicionado do Turismo.
  • Segundo estimativas da Receita Federal, o PERSE custou ao governo um valor entre R$ 17 bilhões e R$ 32 bilhões, entre 2021 e 2023.
  • O fim do PERSE pode retirar da economia brasileira entre R$ 120 a R$ 244 bilhões por ano, em prol de um corte de gastos de cerca de R$ 30 bilhões nos próximos anos.

CNC como centralizador de pleitos

Buscando facilitar a interlocução das entidades setoriais e também dos empresários com as representações políticas, a estrutura CNC-Sesc-Senac funcionou fez o trabalho de interligar as duas pontas. Foi a CNC que liderou o movimento que culminou no manifesto entregue ontem (6) a parlamentares e também no ato público de hoje.

PANROTAS / Filip Calixto
Alexandre Sampaio, diretor do Cetur da CNC
Alexandre Sampaio, diretor do Cetur da CNC

"A CNC fez questão, através do presidente Tadros, e com minha sugestão, de trazermos as mais de 20 entidades do Turismo nacional ligadas à Cetur para estar aqui com os senadores e deputados, para podemos mostrar como essa interrupção do PERSE ameaça o nosso setor e impacta o Turismo como um todo. A CNC viabilizou a vinda de todos e estaremos em um evento juntos manifestando de maneira indelével que a CNC rejeita essa MP do governo e que brigamos pela máxima do #FicaPerse", pontuou o diretor da Cetur (Confederação responsável pelo Conselho Empresarial de Turismo e Hospitalidade), Alexandre Sampaio.

"Queremos descontruir a argumentação do governo federal que foi quase vil, dizendo que o setor de eventos, com essa diferença de arrecadação [entre o período da pandemia e o último ano] fez uma sonegação no passado. Isso é um absurdo. Todo o Turismo sofreu muito e o PERSE permitiu a manutenção do rendimento do faturamento, mas é um processo que precisa continuar para permitir que as contas sejam pagas, afinal foram captados empréstimos para a manutenção dos negócios. A continuação do PERSE é fundamental e o argumento do ministério não se sustenta", continua Sampaio.

O dirigente ainda conta que para hoje a estratégia de atuação do setor está em aberto. "Vamos ver qual a melhor estratégia, ver se é o caso de não indicar deputados para comissão, ou indicá-los. Ou ainda sensibilizar o presidente [Rodrigo] Pacheco para devolver a MP. Estão abertas uma série de opções e isso só foi possível por estamos juntos", conclui.

O que pensam as associações do setor

Abracorp

Humberto Machado, presidente da Abracorp, lembra que o PERSE foi uma ferramenta importante para o Turismo como um todo recuperar o fôlego e sobreviver e que os resultados positivos do ano passado ainda não são o suficiente para se falar em recuperação plena.

"Faturamento não é necessariamente lucro e tivemos empresas que quase quebraram e estão agora conseguindo recuperar o que foi perdido. Para isso o PERSE é fundamental."

Humberto Machado
PANROTAS / Filip Calixto
Humberto Machado, presidente da Abracorp
Humberto Machado, presidente da Abracorp

Clia Brasil

O presidente da Clia Brasil, Marco Ferraz, chama atenção para o indício de insegurança jurídica que a suspensão do programa pode criar. "Acabar com o PERSE é também acabar com a segurança jurídica e previsibilidade de investimentos no País. Há empresas que que tomaram por base os cinco anos que estavam apalavrados quando da implementação do programa".

Sindepat

Murilo Pascoal, presidente do Sindepat, lembra das empresas que se comprometeram com aportes financeiros contando com o cenário do PERSE vigente.

"Muita gente quase quebrou, outros tantos pediram empréstimo para não fechar e, com a facilitação do PERSE estão conseguindo pagar. O que estamos pedindo é para que se cumpra o que já estava acertado, nada mais", diz.

Murilo Pascoal
PANROTAS / Filip Calixto
Toni Sando, da Unidestinos, Murilo Pascoal, do Sindepat, Felipe Carreras, deputado federal, Orlando Souza, do Fohb, e Carolina Negri, do Sindepat
Toni Sando, da Unidestinos, Murilo Pascoal, do Sindepat, Felipe Carreras, deputado federal, Orlando Souza, do Fohb, e Carolina Negri, do Sindepat

Pascoal também lembra que, nesse meio tempo em que a medida está em vigor a taxa de juros subiu para 13%, o que deixa mais cara a operação dos hotéis, parques e demais atividades. Essa subida também é um impacto que tem que ser considerada e na qual o PERSE ajuda.

O presidente do Sindepat também chama atenção para a conta apresentada pelo ministério para justificar o pedido de suspensão. Segundo ele, os empresários e associações já entraram com uma série de pedido para ver as contas do governo em relação ao PERSE.

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Ana Caroline Medeiros, presidente da Abav Nacional
Ana Caroline Medeiros, presidente da Abav Nacional

Abav

A presidente da Abav, Ana Carolina Medeiros, lembra das agências que mudaram seu status para ter acesso ao PERSE e agora podem ficar sem o programa depois de terem contratado e investido em suas empresas. "Acabar com o PERSE é fazer empresários mudarem seu planejamento sem aviso e tirar a flexibilidade de organização dessas agências", afirma.

PANROTAS / Filip Calixto
Guilherme Dietze, coordenador do Conselho de Turismo da FecomercioSP
Guilherme Dietze, coordenador do Conselho de Turismo da FecomercioSP

Fecomércio-SP

O coordenador do Conselho de Turismo da FecomercioSP, Guilherme Dietze, lembra que as empresas ainda estão no caminho da geração de empregos e buscando um novo ciclo de investimentos graças ao PERSE. "Foi colocado um prazo razoável de cinco anos, que era o suficiente para essas empresas se reorganizarem de um grande impacto. Agora com os planos em andamento o programa precisa continuar", pontua.

PANROTAS / Filip Calixto
Fabiano Camargo, presidente da Braztoa
Fabiano Camargo, presidente da Braztoa

Braztoa

Fabiano Camargo, presidente da Braztoa, lembra da cadeia de retrocesso que será gerada com o fim do PERSE. Segundo ele, com o fim do benefício fiscal, as vendas de viagens vão cair, já que toda a cadeia de preços, do hotel à passagem, será reonerada.

"A geração de empregos também tende a diminuir já que tudo deve ficar mais caro", considera.

Fabiano Camargo


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