Felippe Constancio   |   21/07/2016 13:38

O compliance e a ética no Brasil de crise econômica e Operação Lava Jato

Sob as adequações compulsórias impostas pelas leis originadas como consequência da Operação Lava Jato e em momento de crise econômica do País, as auditorias internas são tema recorrente de empresas de turismo - sejam grandes ou pequenas d


Do coindesk.com

Em um contexto de agravamento da crise econômica e de demanda permanente por ética com os mais de dois anos de Operação Lava Jato, a implementação de um código de conduta e de processos internos tem se mostrado cada vez mais como uma obrigatoriedade do que uma opção às empresas. A conjuntura econômica e política em pauta no País está relativizando cada vez mais a premissa de que é mais caro criar controles para evitar fraudes e má gestão do que conviver com elas ou incorporá-las a custos não planilhados.

Conjunto de políticas e diretrizes estabelecidas por uma empresa para seu negócio, o compliance pode eventualmente não entrar no radar de empresas familiares ou com menor exigência legal, mas é a seiva das grandes empresas e das corporações com papéis no mercado aberto, definindo o que é - e o que não é - aceito pelas organizações.

Sob as adequações compulsórias impostas pela Lei Anticorrupção e pela recente Lei Federal nº 13.303, que obriga empresas estatais e/ou de economia mista a criarem órgãos de controle, as auditorias internas são tema recorrente de empresas de turismo e assunto de praticamente todas as reuniões da Associação Brasileira de Agências de Viagens Corporativas (Abracorp), que conta com 32 travel management companies associadas.

COMO FUNCIONA
A estruturação do compliance se dá a partir da auditoria interna de uma empresa, que por sua vez pode ter diferentes pontos de partida. A PwC (Price Waterhouse Coopers), por exemplo, oferece três modalidades de serviços de auditoria: o full sourcing, no qual o solicitante não tem departamento e a contrata como um terceiro; o co-sourcing, em que colabora em um esquema de coparticipação; e a modalidade de designação de pessoal, na qual a PwC dispõe um especialista à solicitante.

"O co-sourcing é bem-vindo quando a empresa tem um departamento de auditoria interna pequeno, mas também chega a terceirizar. É uma modalidade muito usada, de forma geral, mas a modalidade mais usada ultimamente tem sido o co-sourcing, cuja grande vantagem é a presença de uma empresa externa que tem a vivência de fora", conta o especialista na área de Auditoria André Pannunzio.

Independentemente do formato do serviço de auditoria demandado, o plano de ação rumo ao compliance parte de um levantamento geral denominado como "avaliação de risco do ambiente". Em seguida é estabelecido o escopo da auditoria, que aponta quais os principais pontos a serem auditados - como contas a pagar, contingências ou folha de pagamento.

A QUEM INTERESSA
O nível de aderência às boas práticas de governança corporativa varia com os tipos de empresas e dos valores de cada uma. Dessa forma, a tolerância a benefícios ou vantagens concedidas ou recebidos de clientes/fornecedores depende da cultura, mas empresas multinacionais ou listadas em bolsas de valores tendem a ter regras de compliance claras. Normalmente, suas normas levam em consideração políticas e procedimentos inerentes ao setor, explica o sócio da KPMG no Brasil Moacyr Piacenti.

"Em empresas familiares ou com menor exigência legal em relação às boas práticas de governança, é raro encontrar um código de ética e compliance formalizado, assim como uma efetiva política de processos e controles internos, e a avaliação do que é lícito, apropriado e ético passa a ter diferentes critérios, dependendo da percepção e dos valores de cada empresa".

José Cordeiro/SP Turis
José Marcos Miziara Filho, da SPTuris

O EFEITO LAVA JATO

Para muitas empresas, os temas ligados à operação Lava Jato trouxeram reflexões sobre a exposição aos riscos de desvios e de fraudes e uma maior percepção da importância do controle dos procedimentos internos. "Muitas ainda acham que é mais caro criar controles e processos do que conviver com ela. No entanto uma pesquisa feita pela KPMG mostra que desvios e fraudes causadas por seus funcionários podem ter efeito bastante relevante no lucro das empresas", alerta Piacenti.

Uma empresa que se adiantou na tendência de maior controle interno foi a SP Turis (ou São Paulo Turismo). Empresa de eventos da maior cidade do País, a companhia é de capital aberto, possui como sócia majoritária a prefeitura da cidade e tem, entre suas atividades, a administração do complexo Anhembi e do Autódromo de Interlagos, além de estruturar mecanismos que reafirmam o município como polo de Turismo de negócios, entretenimento e lazer.

Gerente de auditoria e controle interno da SPTuris, José Marcos Miziara Filho lembra que há dois anos a empresa chegou a ter pessoal qualificado para uma eventual criação de compliance, mas o plano foi descontinuado em uma administração anterior. "A auditoria interna foi reativada, e agora acaba tendo a função de compliance. A gente vai analisar todos os processos - nossa área de locação de áreas, os espaços a particulares que contratam, eventos de Turismo que a prefeitura contrata. Enfim, os ciclos transacionais que movimentam entrada de receita ou despesa".


José Cordeiro/SP Turis

O executivo conta que a tendência da prefeitura de exigir que as empresas em que ela tem participação tenham um controle interno começou após a criação da CGM (Controladoria Geral do Município), em maio de 2013, cujo propósito de prevenir e combater a corrupção na gestão municipal resulta em controle mais rígido. "Agora também há a Lei nº 13.303, que é federal, e pede que empresas vinculadas ao poder público criem órgãos de controle".

O CUMPRIMENTO DAS POLÍTICAS
Exemplos de aprimoramento de políticas internas podem ser encontrados também em diversas companhias do setor privado, que têm a crise econômica como principal incentivo ao corte de custos e maior controle dos processos administrativos. Recentemente, o PANROTAS Corporativo mostrou em uma série de reportagens especial as eventuais mudanças nas políticas de gestão de viagens de gigantes como Claro, Red bull, Honda e Johnson & Johnson.

O setor de viagens corporativas é um dos que a auditoria interna tem chances de se deparar com "pontos sensíveis". Segundo Piacenti, da KPMG, "do ponto de vista operacional, os temas mais sensíveis e que normalmente estão incluídos nesse programa de trabalho são o cumprimento da política de cotações e aprovação para compras de produtos e serviços, aprovações para concessão de descontos, devoluções e comissões sobre vendas, evidência de efetiva execução do serviço contratado, principalmente quando o serviço não é inerente à atividade fim da empresa, aspectos relacionados à tecnologia da informação e outros".

Por isso, o executivo frisa que quando o assunto é viagem corporativa, uma empresa com boa governança possui processos e controles internos que definem a política de viagens de seus funcionários, diretores e executivos.

"Essas políticas consideram a necessidade de compra de passagem com certos dias de antecedência, cotação com pelo menos três fornecedores, critérios para utilização de classe executiva, regras claras e limites para utilização de serviços".

Se uma boa auditoria interna define claramente limites para concessão ou recebimento de vantagens ou benefícios por parte do cliente ou fornecedor, é conveniente que ela esteja atenta para vantagens ou benefícios que não se caracterizam apenas por recebimento de dinheiro. "Mimos" como empréstimos de aeronaves, caronas em helicópteros, descontos ou upgrade de passagem aéreas, e tantos outros que de alguma forma podem representar quebra de independência do tomador de decisões na contratação de um serviço devem passar pelo "pente fino". Ou as consequências poderão vir mais tarde, em novas Operações Lava a Jato.

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